O advogado e os procedimentos administrativos
Nos idos de 2008, o STF editou a Súmula Vinculante nº 5 definindo que:
“A falta de defesa técnica por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição”.
Com efeito, nossa Suprema Corte agiu em desfavor à indispensabilidade do advogado em procedimentos administrativos, sejam eles quais forem. Inegável afirmar que tal decisum pôs em risco a proteção efetiva do direito de muitos cidadãos, haja vista que qualquer que seja o procedimento administrativo, processo latu senso, a interpretação da lei é requisito indispensável, todavia, seu interprete, com a Súmula Vinculante nº 5 do Colendo STF, ficou definitivamente alijado do processo e viu suas prerrogativas afrontadas, eis que o artigo 133 da CF/88 assegura a imprescindibilidade do advogado na administração da justiça.
Cumpre contextualizar o leitor que a Súmula Vinculante, instituto criado pela Emenda Constitucional 45/04, representa grande avanço em nosso País que sempre se vê diante de tumultuados achismos jurisprudenciais. Veio com o intuito de pacificar a discussão de questões examinadas nas instâncias inferiores do Judiciário e seus varejos decisórios dissonantes. Sua aprovação exige quórum “qualificado” de mínimo de 8 (oito) ministros do STF e, após sua publicação eletrônica no Diário de Justiça, permite que também agentes públicos de outros poderes, que não o judiciário, passem a adotá-la, assim, consubstanciando-se em inegável progresso do direito e da segurança jurídica pátrios.
É fato inegável a segurança jurídica advinda da referida vinculação decisória, eis que muitas decisões proferidas em processos administrativos, sanções principalmente, ficaram adstritas ao entendimento predominante, encurtando etapas procedimentais e “inovações” decisórias por parte da Administração Pública, p. ex., em decisões em processos administrativos tributários. A vinculação das decisões é avanço que não se discute aqui.
Desse modo, sigamos o foco desta análise, cujo interesse está na proteção do cidadão e a busca da correta aplicação da Constituição Federal em seu capítulo das Garantias Fundamentais.
Nesse sentido, o Conselho Federal da OAB já se manifestou em relação à Súmula nº 5, alegando violação aos artigos 5º, inciso LV, e 133 da Carta Magna, que asseguram o direito de um defensor legalmente habilitado, que possa atuar com competência certificada pelas diversas seccionais da OAB (Exames da Ordem) na defesa dos direitos das pessoas físicas e jurídicas inclusive.
Fato é que a Administração Pública sempre será poderosa e dotada de grande capacidade de recursos disponíveis para manutenção de suas funções e atribuições, no entanto, o cidadão-administrado será sempre frágil diante deste poderio e por que não dizer, hipossuficiente em qualquer relação jurídica que se estabeleça frente ao Poder Público. Diante disso, ao cidadão deve ser garantido seu direito de estar bem representado e com certo nivelamento de oportunidades técnicas perante o Todo Poderoso Estado.
Assim, garantir a participação de um advogado em um procedimento administrativo em que se discutam direitos e deveres do cidadão, análises normativas em várias esferas, não se trata de corporativismo da OAB, mas da firme defesa da garantia e dos interesses da sociedade como um todo. Aqui está em jogo a coletividade, foco da prestação do Estado por meio de um serviço público de qualidade e com isonomia.
Como paradigma, para melhor compreensão do cidadão comum, imaginemos um procedimento administrativo, como o inquérito policial, sendo conduzido sem a presença de um defensor com competência atestada pela Ordem dos Advogados do Brasil e legalmente constituído. Seria razoável que esta defesa fosse feita por alguém sem habilitação para tal mister? Com toda a vênia as demais profissões regulamentadas, por óbvio que não, o risco e o dano envolvidos poderiam ser irreversíveis e de dificílima reparação.
Há que se trazer o tema da representação qualificada e atestada para os procedimentos administrativos, todos estes; com a efetiva e legítima participação de um defensor legalmente habilitado. Obviamente, que imprescindível seria o apoio de expert com tecnicismo destacado, respeitada suas respectivas formações, para a consecução e atingimento da melhor defesa do cidadão sempre capitaneada por um defensor dos quadros da OAB. Aí sim poderia se falar em respeito às garantias fundamentais constitucionais, com destaque à ampla defesa (defesa pessoal e técnica), garantindo o devido processo legal e a paridade de armas, princípios tão caros ao Estado Democrático de Direito.
Por fim, e para a reflexão, poderia a Ordem dos Advogados do Brasil envidar seus melhores esforços para promover o debate junto às instituições e fazer valer a presença do advogado, também, na condução dos processos administrativos, quer sejam disciplinares ou não.
Por Henrique Martins Farias
Sócio e Regulatório RIG na Antunes Mascarenhas